sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Um desabafo - Para meu filho

Escrito em 23/04/2010 - Dia do enterro do meu baby

De onde vem? Os bebês eu sei, e a doença que veio acompanhar o meu gurizinho, há de ser explicada. Mas, de onde vem a minha força?
Não é só dos meus amigos, do consolo dos familiares, do amor que sinto pelo meu Nelson. Aliás, peça fundamental nessa batalha. Redescobri o amor que sinto por ele e, tive a certeza do amor que ele tem por mim.
Acho que encontrei a resposta. A "força estranha que me leva a cantar, essa força estranha no ar", é amor. Amor que doa, amor que dói.
Amor que compreende e que erra também. Afinal, se em tudo na vida da gente, não existe perfeição, o amor não pode e nem deve ser perfeito.
E esse amor que há alguns meses surgiu dentro de mim, é o 'amor-além'. Sei que nunca ouviram falar dele, mas eu senti. Como milhares e milhares de mulheres deste mundo, como as tantas que eu vi passar nesses quase sete dias que estou aqui (Hosp. Nossa Srª Conceição); Porém, elas ainda não perceberam, - ou será que essa percepção é só minha?! -, que a alma delas está conectada com Deus, o Pai da Criação?!?!
Tornei-me amiga d'Ele. Fui escolhida. Não apenas mais uma. Fui 'a' escolhida. Posso parecer pretenciosa e de certa forma, sou quando digo isso. Mas, sei também, que não foi em vão. Alguém aprendeu muito, posso afirmar, eu aprendi.
Aprendi que o amor vai além de bombons, flores, declarações e melodias, de beijos quentes e corpos suados.
'Aquele' amor, cuida acalenta, beija, canta canções de ninar, chora, sorri. Aprende com as dores, contrações, com a insônia, com a fome na madrugada.
É o amor que ama antes mesmo de pegar na mão, de olhar no rosto, de saber a fisionomia. É além do que se pode imaginar, além da terra, do céu e do mar.
Um fio de seda com que se ligam duas almas.
Descobri que poderia cuidar mais de mim, alimentar-me melhor, sorrir, mudar hábitos, sem esforço algum. Apenas amando.
Descobri que sou mais forte que as dores carnais e, muito mais feliz com um simples e singelo grãozinho de arroz dentro de mim. Nele batia um coraçãozinho que dependia do meu.
Também descobri a dor. Perder não é fácil.
Quando tiraram mamãe de mim, perdi um pedaço que faz falta, muita falta.
Agora, um pedaço? Não. Metade! Exatamente a metade de tudo o que eu havia me tornado desde a perda dela.
Aquela menina-mulher que quis erguer-se e seguir adiante, casou-se cedo e quis constituir família, ser mãe; Agora, é apenas mais uma 'desasada' que quer um colo quentinho, um peito cheio de carinho, uma mão amiga. (De uma enfermeira querida!)
Fui tudo o que ele precisou. Fui tudo o que Deus quis e permitiu que eu fosse. Fui mãe. (Serei mãe!)
Quis até mesmo, sentir dor sem necessidade. Deus deixou-me ser mãe tão legitimamente, tão diretamente no sentido da palavra, que até na hora do adeus eu protegi. Ele estava quentinho, dentro de mim, guardadinho, longe do mundo gelado, sendo amado.
E será. Para sempre!
Hoje choro a dor da partida. Por não ter ouvido o chorinho dele, não ter amamentado, por ele não ter visto o amor em meus olhos marejados, por ele não ter sentido o calor que o meu abraço reservava para aquele corpinho tão frágil.
Não há como não chorar. Também não há como esquecer o fato, de que lá no céu, não existe mãe melhor do que a minha para cuidá-lo.

Porto Alegre, 23 de Abril de 2010.
22:41 - Quarto 2054 - Leito 01
Hospital Nossa Senhora da Conceição

Eternamente Daniel